
Com a popularização das mais diferentes mídias, tornou-se bastante difundida a crença de que a existência significativa de alguém está diretamente ligada ao número de visualizações. Dito em outras palavras, trocamos nossas experiências relacionais pela simples captura de seguidores.
A noção de “seguidores” tem por fundamento a crença, mais ou menos evidente, de que podemos quantificar quem acompanha ou “consome” o que temos para mostrar. De início, a etiqueta implícita nesse novo ambiente recomendava a reciprocidade, ou seja, se você me segue, eu também seguirei você. Isso demonstrava, a princípio, que uma rede social tem justamente o poder de ser “social”, ou seja, de que pessoas se dispõem a um exercício de trocas simbólicas, sinceras ou não.
Porém, observamos cada vez mais que a noção de seguidores tem se tornado uma via de mão única. Quanto mais a pessoa se considera notoriamente importante, o que a faria “descer” ao nível dos comuns para “segui-los” de volta?
É interessante notar que os seguidores que não são seguidos também não parecem se importar com isso. Pelo contrário, se por um acaso do destino essa pessoa é seguida, tem ao menos tem um comentário ou ainda uma curtida de uma tal figura notória, entra em estado de euforia, tanto por crer que despertara o interesse de alguém cuja vida é para ela muito mais significativa do que a sua, quanto pela possibilidade de conseguir, com essa benesse, o seguimento de tantos outros que passariam, em tese, a considera-la também um “alguém”.
Fato é que “existir para o outro” é uma experiência complexa, desafiadora, mas absolutamente ligada ao que nos caracteriza como humanos. O que as redes fizeram de modo absolutamente insensível foi ranquear e valorar essa existência em termos meramente quantitativos, ou seja, números sem essência. E é exatamente essa medida distorcida que faz com que as pessoas percebam e mensurem a sua significância no mundo.
A partir desse comportamento, podemos rolar ladeira abaixo e começar desesperadamente a buscar esse lugar no mundo. Para isso, muitos acreditam ser preciso transformar o existir em “conteúdo” e colocá-lo ao julgamento das pessoas e dos algoritmos. Surgem, assim, os gurus, as fórmulas e a captura por tantas e tantas mentorias, de todos aquelas que desejam aprender a existir nesse ambiente e, com isso, passar a ser alguém também no mundo “offline”. Quando não é possível tamanha sofisticação, copia-se abertamente toda e qualquer futilidade que tenha obtido com o outro, o “engajamento” que tanto se deseja.
Tudo isso tem adoecido as pessoas. Tem feito com que elas não se reconheçam em sua singularidade, em sua beleza que é escondida, padronizada e empacotada em camadas e mais camadas de filtros ou recompostas pelo bisturi das inteligências artificiais. Deixamos de ser sociais até nas redes. Olhamos sem nos envolvermos. Achamos que o que ganhamos do outro é como um tributo ordinário de uma vassalagem eletrônica. Ou, para piorar ainda mais, usamos as redes também como um campo aberto para a nossa selvageria, uma fossa aberta para os nossos ódios, violências e ignorâncias e insanidades.
Ser e existir é muito mais do que parecer. Quem é meramente seguido, não necessariamente vive a fantástica experiência das verdadeiras trocas humanas. E é possível ter essa experiência vibrante e genuína até mesmo nas redes. Elas podem ser fantásticas, se nos dispormos a fazer delas exatamente o reflexo da nossa melhor essência.
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